domingo, 29 de novembro de 2009

Costureira de personalidade forte vira estrela de filme

Taça de champagne AV2
Por : Bruno Mourao




Na cidade de Cordeiro, no Estado do Rio, mais precisamente no bairro Santo Antonio, popularmente Arraial do Sapo, reside até os dias de hoje uma ex- costureira muito antiga da cidade, diga-se de passagem, costureira de mão cheia. Seus vestidos, saias, ternos eram exibidos nas mais diversas festas da cidade. Mariquinha: assim que ela é conhecida.



Talvez a surdez, que sofreu ainda no útero materno, tenha feito de Mariquinha uma pessoa de temperamento forte e difícil de lidar. No entanto, essa dificuldade não a impediu de seguir a sua vida, principalmente a profissional, que desempenhou com muita arte. Suas habilidades fizeram da costureira uma das mais disputadas da cidade.


A independência financeira foi conquistada com o trabalho diário na máquina de costura. A situação ficou tão confortável, que ela passou a emprestar dinheiro a juros. Agiota? Pode ser, mas na cidade onde mora emprestar dinheiro é antes de tudo uma questão de camaradagem, de ajudar ao próximo, digamos assim.

Seu temperamento instável fazia com que em certos dias ela até largasse as costuras para contar histórias para os sobrinhos ou para as freguesas que passassem pela sua porta. Às vezes perdia horas na janela da sala vagando em pensamentos ao fitar ao longe. Sua irmã Cristina era a sua preferida nas discórdias, pois dividia o mesmo quarto, o qual era o seu mundo. Lá ela criava os modelos de vestidos, riscava os moldes, cortava os panos, costurava na máquina. Esse seu mundo a noite era invadido por sua irmã que chegava em casa cansada do trabalho.


Para não ver o seu mundo de todo invadido, Mariquinha usava a sua mente criativa: transformava a sua ferramenta em um divisor de fronteiras. Do lado esquerdo da máquina, o quarto de Mariquinha. Do lado direito, o da sua irmã.

Ela de tão conhecida, que é foi um dos personagens do livro Retratos de um Tempo, escrito pela professora de língua portuguesa e literatura, Madalena Tavares de Miranda. Um dos trechos do livro se referia à casa dos seus pais, onde morava, da seguinte forma



“... A casa de seu Júlio Nunes e Dona Darcília.. Esta vinha sempre à janela e sorria muito. A porta da sala raramente se abria se não para as freguesas da filha, Mariquinha, nessas visitas, saíamos com as mãos, repletas de retalhos para as roupas das bonecas.”



Mas a vida familiar passou a ser complicada. No silêncio que a acompanhava, a desconfiança sempre rondava a sua volta. A começar pelos próprios irmãos. José Nunes, Antonio,Cristina e Mariquinha faziam  parte de uma família muito humilde. Apesar de ser amparada pela mãe, que de certa forma a protegia, a costureira se sentida diferente, muitas vezes se revoltava, ficava agressiva com aqueles que com ela dividiam a mesma casa. Não gostava de sair, pois não se sentia bem no meio de muita gente. Já sua irmã Cristina trabalhava fora de casa e tinha muitas amigas, passeava nos finais de semana. Até isso era motivo de rivalidade, de discussão entre elas.



O que piorou na adolescência. Quando a irmã começou a namorar, Mariquinha começou a rejeitá-la. A fronteira no quarto teve que ser reforçada: um lençol que formava uma espécie de cabana substituiu a máquina de costura.
A inveja atordoava a sua mente fértil. Nos finais de semana, Cristina trabalhava preparando o seu enxoval: bordando com carinho e capricho, pois o casório já estava próximo.
Mariquinha por sua vez irritada com tudo aquilo, observava sem nada dizer. Sua mente o tempo todo trabalhava para de algum jeito atrapalhar ou atrasar o trabalho da irmã.



Um belo dia, a irmã, chegando do trabalho, foi até o baú que ficava no canto do quarto, e para a sua surpresa, quando o abriu, não viu o seu enxoval. Saiu calada, e foi até a cozinha comentar com sua mãe, mas foi em vão, pois sua ela de nada sabia. Mariquinha estava sentada à máquina e não deu bola para irmã.



A mãe assustada e temendo uma discussão mais forte, foi à caça do enxoval da filha. Não demorou muito, entrou pela porta da cozinha trazendo o tal enxoval, porém todo sujo. Mariquinha havia jogado no quintal das galinhas. Cristina chorou muito e ficou aborrecida com a atitude da sua irmã mais nova. A mãe pediu a filha para não brigar com irmã, pois ela lavaria todo o enxoval e guardaria no mesmo lugar, e depois com calma conversaria com Mariquinha.



Esta pessoa de gênio difícil teve a sua vida inspirada em um dos personagens do curta metragem “Hora das almas”, do projeto Revelando os Brasis, produzido no ano de 2005. A costureira, que aparece nas cenas do curta se refere a esta pessoa tão popular. O curta foi produzido e filmado pelo professor Luiz Antonio Cavalheiro, morador de Cordeiro, e também morador do bairro Santo Antonio.


Mas hoje, ela não fica mais na janela vagando em pensamentos, e sim na porta de sua casa, para desabafar gritando, às vezes insultando as pessoas que passam em frente. Às vezes ela grita para o vazio, esperando que alguém possa ouvi-la. Grita por socorro, grita para mostrar a todos que ainda vive.

Um comentário:

Anônimo disse...

[url=http://aluejxfttk.com]qMeHJy[/url] , WQASMmUivXZhiBl , http://pyfnknfrtw.com