terça-feira, 24 de novembro de 2009

MUNDO VIRTUAL: FAZER PARTE OU NÃO FAZER? EIS A QUESTÃO

A internet é uma evolução, traz novos hábitos e aniquila outros

Por Jaqueline ferreira
Taça de Champanhe- AV2

Sexta-feira à noite. Momento tão esperado. É hora de encontrar os amigos, conversar fiado, ver as crianças brincando na rua, brindar o fim de semana.

João e Wanderson moram em Sumidouro, interior do Rio de janeiro. São muito amigos e aproveitam a noite de sexta para jogar conversa fora. Eles dão risadas, comentam sobre o que aconteceu na escola, as novidades da galera, combinam programas para o final de semana. Mas se vocês pensam que os dois estão em um barzinho ou na praça, se enganaram. Cada um está em casa fazendo tudo isso diante da tela de um computador.

Com a intenção de entender melhor a sociabilidade na rede, abri mão da facilidade e do conforto que a internet possibilita e fui até a casa de João para entevistá-lo cara-a-cara. No caminho, rua vazia e muito silêncio. Encontrei apenas um garotinho, brincando sozinho com sua bola. Cenário incompatível com as lembranças da minha adolescência.

Me lembro da rua fervilhando. As crianças brincando de futebol, queimado e tudo o que a imaginação permitisse. E nós, eu e minhas amigas da época, saíamos para bater papo até às 22 horas. Só depois da hora-limite, imposta por nossos pais, a rua silenciava.

Morar no interior nos possibilitava ter mais liberdade e mais segurança para sair à noite. Todos se conheciam e sabiam detalhes da vida alheia. Era um tempo de relacionamento direto, de discutir quando se estava chateado, abraçar os amigos e até de pedir aquela folclórica xícara de açúcar ao vizinho.

Tempos modernos
João de Almeida tem 16 anos, é estudante do Ensino Médio e pertence a uma geração acostumada desde cedo com a presença do computador. Ele acha normal se relacionar por MSN.

― Com a internet faço novas amizades, pesquisas e até namoro. No MSN eu fico mais solto, perco a minha timidez. Falo coisas que tenho vergonha em dizer pessoalmente.

Mesmo estando integrado no mundo virtual, o adolescente procura manter as suas amizades reais e tem a consciência de que a internet aproxima e também distancia as pessoas:

― Com os meus amigos reais procuro fazer algumas atividades juntos, como, por exemplo, sair aos sábados. Antes da internet a gente se via mais, eu ia até eles. Sinto falta, mas prefiro ficar em casa.

As relações familiares e alguns hábitos do cotidiano também mudaram.

― Desde que a internet chegou aqui em casa, nunca mais jantei com os meus pais. Fiquei um pouco mais distante, mais isolado. Minha mãe tenta controlar o meu tempo no computador, mas mesmo assim nos afastamos. Sei que tem como evitar, mas a gente não consegue― confessa o jovem.

Nesse momento, o pai de João entrou na conversa e lembrou com nostalgia os seus tempos de garoto.

― Meu filho chega em casa e vai direto para o computador. Não gosta de ser incomodado. Antigamente, não tínhamos essa novidade. Jogávamos bola de gude, brincávamos de pique esconde na rua e tínhamos até tempo para fazer brinquedos de madeira. Hoje falta criatividade. Tudo já vem pronto― lamenta Julcinei de Lima, 49 anos.

Inconformado com a crítica, João entrega seu pai:

― É, ele fala isso, mas tem Orkut, volta e meia mexe na internet.

Meio sem graça, Julcinei admite:

― Eu vejo as novidades, as notícias, culinária, meu Orkut. Fazer o quê? É a evolução.

Evolução que gera a modificação
Mesmo estando integrado ao mundo virtual, Julcinei sente falta das reuniões em torno da mesa, da troca de experiências, de saber como foi o dia dos familiares e de ensiná-los a fazer os tais brinquedos. Sua geração não se acostumou com as amizades mediadas por computador, ao contrário do filho.

Me despedi. E grande foi a minha surpresa ao chegar na casa de Wanderson. Encontrei João contando para o amigo como tinha sido engraçada a entrevista que acabou de acontecer. Papo, é claro, feito pelo MSN.

Wanderson Ferreira, 15 anos, é louco por internet. Sua família não impõe regras sobre o tempo gasto na web e o jovem tem total liberdade para navegar a hora que quer.

Meus pais não me controlam. Tenho liberdade para acessar, mas essa liberdade é baseada na confiança.

O estudante revela ainda a conseqüência dessas horas dedicadas à rede:

Antes a família se reunia para ver novela. Agora eles ficam lá e eu aqui na net. Não saio mais a noite para falar com os amigos, não preciso sair.

Ficar horas na internet é uma realidade na maioria dos lares. De acordo com uma pesquisa realizada pelo IBOPE Nielsen Online, em julho deste ano, o tempo médio de navegação por usuário em casa ou no trabalho, no Brasil, foi de 48h e 26min. Esse número sobe para 71h e 30min se for levado em consideração o uso de aplicativos, como programas de downloads e tocadores de música.

A pesquisa mostrou também que o Brasil lidera o ranking mundial de tempo de navegação em ambientes residenciais. O país, com as suas 48h e 26min, ficou na frente dos Estados Unidos (42h e 19min), Reino Unido (36h e 30min), França (33h e 22min), Japão (31h e 55min), Espanha (31h e 45min), Alemanha (30h e 25min), Itália (28h e 15min), e Austrália (23h e 45min).

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